terça-feira, 31 de outubro de 2017

Indira era a Índia

Em 31 de outubro de 1984, a primeira ministra da Índia, Indira Gandhi, foi assassinada na sua residência oficial por dois seguranças.

Indira Gandhi, apesar do sobrenome, não tinha laços de parentesco com o pacifista revolucionário Mohandas "Mahatma" Gandhi, líder do movimento de independência da Índia. Ela era, contudo, filha de Jawaharlal Nehru, o primeiro a ocupar o cargo de Primeiro Ministro da Índia independente e amigo próximo do Mahatma (o sobrenome Gandhi veio do marido Feroze Gandhi, jornalista que também não era parente do mesmo). Indira estudou na Europa, e ao retornar à Índia, serviu próxima ao pai enquanto primeiro ministro. Logo ela presidia o Congresso com punho firme, e, após a morte de Nehru, passou ao Ministério das Comunicações. Em 1966 o primeiro ministro Lal Bahadur Shastri morreu, e a cúpula do Partido do Congresso (a força política majoritária da Índia desde o tempo do protetorado britânico) orquestrou a eleição de Indira ao cargo, pensando que ela seria forte apenas o suficiente para vencer o candidato da oposição, porém não tão forte que pudesse impor quaisquer dificuldades às aspirações do partido. De fato, a mídia indiana a chamava de "fantoche". Contudo, dificuldades econômicas levaram a derrotas do Partido do Congresso nas eleições regionais, e Indira logo começou a se indispor com seus líderes buscando soluções à esquerda para os problemas do país, além de indicar políticos de outros partidos ou independentes para cargos públicos.

Indira foi reeleita em 1971. No seu segundo termo, Gandhi obteve uma vitória estratégica ao apoiar, com sucesso, a independência de Bangladesh, então sob controle do do Paquistão, com quem a Índia se atrita por questões territoriais e religiosas desde antes da sua independência até hoje. Ela resistiu a um processo de impeachment por crimes eleitorais, mas o processo (que aconteceu em 1975, enquanto o país sofria com a crise do petróleo deflagrada dois anos antes) foi desgastante politicamente. Seu gabinete e seus ministros apelaram ao presidente Fakhruddin Ali Ahmed (indicado ao cargo por Gandhi em 1974) para declarar Estado de Emergência, concedendo à chancelaria o poder de governar por decreto. O resultado das sucessivas crises veio nas eleições de 1977, quando Indira foi derrotada. Ela retornaria ao Congresso como a principal força de oposição (passando por cima de Yashwantrao Chavan, indicado como líder pelo próprio Partido do Congresso).

Nos seus dois termos como primeira ministra, Gandhi mantivera a inflação e o desemprego sob controle, implementando melhorias graças à nacionalização de setores estratégicos da economia, blindando-a contra as pressões internacionais. Porém a crise do Irã e a alta do petróleo atropelaram seu sucessor, pavimentando caminho para uma nova candidatura. Em 1980, buscando apoio de muçulmanos, tamiles (Indira foi atacada por membro de um grupo separatista tamil em visita a Madurai, no sul do país, mas o jornalista Nedumaram a protegeu com seu corpo, sendo apedrejado. Nedumaran ainda hoje milita em causas humanitárias na região), e outras minorias étnicas e religiosas, foi eleita com larga vantagem para um terceiro mandato.

No ínterim entre o segundo e o terceiro mandatos, o partido Akali Dal, de maioria sikh, assumiu o poder no importante estado de Punjab. Os sikhs são um grupo religioso de origem punjabi, que cultuam uma única divindade, revelada pela sabedoria de seus gurus. Pregam, se não a dissolução, ao menos a igualdade de tratamento a todas as castas, desafiando a tradição hinduísta. Também tem um código rígido de vestimenta, o que inclui um turbante alto chamado Dastar que envolve os cabelos, que não devem ser cortados (o código é tão rígido que sikhs residentes no Reino Unido tem autorização especial para portar o kirpan, uma adaga curva, um dos símbolos invioláveis da religião; o atual governo canadense conta com dois ministros de Estado sikhs, que se apresentam formalmente com seus Dastars, kirpans, e demais assessórios). Quando assumiram o Punjab em 1977, o Partido do Congresso passou a apoiar o líder ortodoxo Jarnail Singh Bhindranwale, visando minar o poder do partido dominante através de um líder religioso extremamente popular. Contudo, as disputas internas no Punjab logo se tornaram violentas, e o nome de Bhindranwale passou a ser associado com atos violentos e execuções de rivais. Ele se entregaria à polícia em 1981, mas seus seguidores ainda se envolveriam em episódios de violência. Ele recebeu perdão do ministro do interior de Indira Gandhi e foi para casa como um herói.

O norte da Índia entrava em um período de tumulto. Enquanto o Akali Dal pregava a desobediência civil, comunistas, grupos extremistas sikhs, e a polícia envolviam-se em constantes confrontos. Bhindranwale encorajava seus seguidores a andarem armados. Em 1982 ele foi convidado pelo líder do Akali Dal, Harcharan Singh Longowal, a uma reunião no Templo de Ouro, local sagrado para os sikh em Amritsar, Punjab. Bhindranwale ficou hospedado com uma comitiva na casa de hóspedes do templo, mas, com consentimento do partido sikh, acabaria trazendo cerca de 200 seguidores para lá, para compor sua segurança. Na prática, Bhindranwale transformava o santuário em uma fortaleza, onde recebia a imprensa internacional para chamar atenção à sua causa. O Akali Dal operava o braço político dos sikh, enquanto Bhindranwale era seu líder religioso mais importante e principal coordenador de ações diretas contra o governo de Nova Delhi. Nas entrelinhas do movimento estava a criação do estado do Khalistão e sua autonomia, fomentadas pelos Sikhs desde a década de 1940.

Em abril de 1983, depois de uma reunião com Bindranwale, o inspetor de polícia do Punjab foi assassinado na saída do templo. Logowal acusou Bindranwale pelo assassinato e retirou seu apoio. Em dezembro de 1983, homens de Bindranwale, armados com fuzis, entraram no templo, montaram barricadas e armaram metralhadoras no seu terraço. A cidade viveu meses de inquietação silenciosa.

Em junho de 1984, após negociações infrutíferas e mal conduzidas, Indira Gandhi ordenou a execução da Operação Estrela Azul. Contra recomendações de militares de alta patente, alertando para o sacrilégio de usar força militar contra fiéis refugiados em um templo, ela ordenou o corte das comunicações, da eletricidade, e o bloqueio de todas as estradas e paralisação do transporte público em todo o estado de Punjab, isolando-o do resto do mundo. Ao longo de 9 dias, 10 mil soldados, paraquedistas, e helicópteros invadiram, bombardearam e perseguiram rebeldes no Templo de Ouro e arredores. Bindranwale e outros 150 militantes morreram, causando 700 baixas ao exército indiano.

O que poderia representar uma vitória acabou sendo um revés para Indira. A opinião de militares, imprensa, e órgãos de defesa dos direitos humanos dentro e fora da Índia oscilavam entre críticas ao uso excessivo da força, à violação à liberdade de informação (pelo corte das comunicações), e violações graves aos direitos humanos - a escolha da época do ataque, início de junho, coincidiu com o fim das celebrações do martírio de um guru sikh, ou seja, a cidade e toda a região do templo recebia visitantes peregrinos de todas as partes. Mais de 400 mortes de civis foram registradas oficialmente, e isso foi considerado por muitos como um ataque deliberado àquela religião. O historiador Harjinder Singh Dilgeer defende que Indira Gandhi planejava o ataque ao Templo de Ouro havia muito tempo para construir uma imagem heroica e vencer as eleições no fim daquele ano (outra tese era de que o ataque visaria bloquear a influência do Paquistão, que planejaria o apoio aos rebeldes). Cinco mil soldados sikhs do exército indiano se amotinaram, resultando em repressão violenta.

Indira era naturalmente escoltada por seguranças armados, mas temia que pudesse ser assassinada a qualquer momento. No dia 30 de outubro de 1984, visitando o estado de Odisha, teria dito: "Eu estou viva hoje. Posso não estar aqui amanhã. (...) e quando eu morrer, posso dizer que cada gota do meu sangue revigorará a Índia e a fortalecerá." Um destes seguranças era Satwant Singh Agwan. Outro era Beant Singh. Ambos, nos dias que sucederam à Operação Estrela Azul, converteram-se ao sikhismo. Ambos trabalhavam em turnos alternados, mas Satwant alegou problemas estomacais e trocou de horário com outro segurança, para levar a cabo o plano com o colega.

Na manhã de 31 de outubro, enquanto Indira saía de casa para uma entrevista com o ator inglês Peter Ustinov, Beant se aproximou e disparou três tiros de revolver na sua barriga. Quando ela caiu, Satwant descarregou sua submetralhadora sobre a primeira ministra, que só viria a morrer no hospital, 5 horas depois. Ambos largaram as armas e se entregaram imediatamente. Beant teria sido morto durante uma confusão com os demais seguranças na sala em que havia sido levado a interrogatório, e o colega ferido e levado a julgamento.

Na corte, Satwant disse não ter "ódio contra qualquer hindu, muçulmano, cristão, nem ódio por qualquer religião. Depois do meu martírio, não permita que um sikh atire uma pedra a qualquer hindu. (...) Se criarmos um banho de sangue, não haverá diferença entre nós e Rajiv Gandhi" (filho de Indira, nomeado seu sucessor, e responsabilizado pela onda de perseguição aos sikhs que se seguiu ao assassinato de sua mãe). A execução de Satwant e um tio de Beant (condenado por ter orientado o sobrinho a cometer o assassinato) em 1989 foi seguida de violência, com a morte de 14 hindus por militantes sikhs no Punjab no mesmo dia. Seus corpos foram cremados e as cinzas nunca devolvidas às famílias.

A família de Indira Gandhi continua protagonizando a política indiana - Sonia Gandhi, nora de Indira, é atualmente presidente do Congresso Nacional; o neto Rahul é vice-presidente do Partido do Congresso, e seu primo Varum Gandhi deputado pelo partido Bharatiya Janata. Indira construiu uma reputação internacional positiva atuando na mediação de conflitos, mantendo a Índia, na medida do possível, como um protagonista entre os países não alinhados durante a Guerra Fria (a despeito do seu movimento a favor da União Soviética por conta da hostilidade da China e dos Estados Unidos nos anos 1970), e por ter implantado, pela via socialista, políticas públicas que impediram a ruína econômica diante de crises internacionais de grande magnitude, diminuindo o desemprego e controlando a inflação, conferindo à outrora frágil economia indiana uma autonomia que a levaria a um contínuo crescimento nas décadas seguintes. Contudo, a Índia permanece em constante tensão interna por questões étnicas e religiosas, que ela não conseguiu resolver - e, no caso da relação com os sikhs, apenas piorou. No Punjab, onde os sikhs somam mais de 20 milhões de pessoas, os assassinos de Indira Gandhi ainda recebem homenagens - em 2014 foi produzido um filme exaltando o seu feito no incidente do assassinato, mas sua distribuição foi proibida pela autoridade de Nova Delhi.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A Revolta de Asen e Pedro

No dia de São Demétrio de Tessalônica, 26 de outubro de 1185, os irmãos Teodoro (mais tarde, Pedro) e Ivan Asen deflagraram uma revolta contra os impostos abusivos cobrados pelo Império Bizantino para custear o casamento do seu imperador. Esta revolta resultaria na independência da Bulgária e na coroação de ambos como tsares.

A partir do século IX os búlgaros, então uma confederação de tribos semi-nômades, se organizaram num império próprio que rivalizava com o Império Bizantino nos Bálcãs. Invasões de magyares (os atuais húngaros, que faziam parte originalmente da confederação búlgara), pechenegues (uma tribo proto-turca), e a ascendência da Rússia Kievita desestabilizaram o Primeiro Império Búlgaro ao ponto da maior parte do seu território ser absorvida pelo Império Bizantino, e os búlgaros perderem a sua autonomia.

As coisas permaneceram assim por mais ou menos um século e meio. A aristocracia búlgara era aplacada por privilégios garantidos pelo trono de Constantinopla, mas mesmo assim muitos deles foram expatriados para cidades na Anatólia, deixando a população búlgara sem líderes naturais ou legítimos (no sentido de "alguém com condições de recrutar um exército"). A religião também foi usada como forma de desconfigurar a identidade nacional búlgara: a estrutura to patriarcado ortodoxo búlgaro foi submetida a um arcebispo que respondia diretamente ao Patriarca de Constantinopla. Porém, os búlgaros continuaram em suas terras, e nenhum processo de aculturação funciona enquanto o Estado trata a população cativa de maneira distinta, especialmente dentro de sua própria casa. Foi o erro que levou à revolta de 1185.

Andrônico I Komnenos foi imperador bizantino por dois anos. Neste período, o idoso imperador parecia mais preocupado em assegurar um descendente da sua própria linhagem pela supressão ao poder de barões locais do que em manter as estruturas que o seu pré-antecessor, o reformador Manuel I Komnenos, havia estabelecido para reerguer o império em todos os campos. Num episódio particularmente violento, ele ordenou a execução de prisioneiros, exilados, e suas famílias, causando revoltas por todo o império. Andrônico foi deposto e executado por um militar (que, embora tivesse se envolvido em duas revoltas contra o mesmo, havia sido mantido no cargo graças aos laços com a família Komnenos), Isaque Angelos, que assumiu o trono como Isaque II.

O novo imperador assumiu no meio de uma invasão de normandos baseados na Sicília, e investiu tudo que podia para expulsá-los com sucesso. Antevendo as dificuldades econômicas políticas que enfrentaria dali para frente, achou melhor garantir-se no trono através de alianças com potências regionais. Ele arranjou rapidamente o casamento de uma sobrinha com um príncipe sérvio, e de sua irmã com um nobre italiano (Conrado de Montserrat, um senhor de terras influente que poucos anos depois viria a ser um dos principais comandantes na Terceira Cruzada, e coroado rei de Jerusalém). Para si mesmo, obteve a mão de uma princesa húngara, Margarida, cujo parentesco a ligava ao Sacro Império Romano, às nobrezas russa, italiana, e francesa, bem como à própria nobreza bizantina. O arranjo se deu ainda em 1185, mas a cerimônia seria realizada, em Constantinopla, no ano seguinte. A ocasião serviria para exibir todo o poder e glória do imperador. Porém, com os cofres vazios, a saída para bancar a festa seria o aumento de impostos.

Os búlgaros, na sua grande maioria, eram pastores, camponeses, artesãos. Desde a anexação da Bulgária, o antigo esplendor imperial de suas principais cidades foi diluído nos cofres bizantinos. A taxação criada por Isaque II, no entanto, não levava em consideração o que cada comunidade podia oferecer em relação ao que produzia. Era uma taxa horizontal e uniforme, que penalizava os mais pobres, que eram as populações dos Bálcãs propriamente ditos, os búlgaros e valáquios, que também haviam sido anexados. Em protesto, dois irmãos, Teodoro e Ivan Asen (ou "João", que é o equivalente a Ioan em búlgaro), filhos de um rico pastor valáquio e, possivelmente, administradores de uma criação de cavalos imperial perto de Tarnovo (atual Veliko Tarnovo), foram escolhidos pelos búlgaros e enviados à atual cidade de Ipsala expressar, diante do imperador, sua indignação com a medida. Condicionaram sua obediência a posições de comando no exército e a posse de terras. Isaque sequer concedeu-lhes audiência, mas um tio seu ordenou que Ivan fosse esbofeteado pela insolência.

Os irmãos Asen retornaram às suas terras e conclamaram o povo a uma rebelião. Mas seus compatriotas temiam mais a repressão bizantina do que a sua opressão fiscal. Era preciso outra estratégia para unir búlgaros e valáquios contra os bizantinos. Uma saída seria pela via religiosa, e, em meio à guerra entre bizantinos e normandos, a invasão à Trácia viria bem a calhar.

A cidade de Tessalônica foi saqueada pelos normandos em agosto de 1185, gerando a cadeia de eventos que levaria à queda de Andrônico. De alguma forma, os ícones de São Demétrio de Tessalônica, padroeiro daquela cidade e principal santo adorado pelos búlgaros, vieram parar em Tarnovo. Os irmãos Asen, ainda de mãos vazias, coordenaram a construção de um pequeno templo dedicado ao santo (atualmente a igreja de São Demétrio de Tessalônica, em Veliko Tarnovo), onde suas relíquias eram exibidas. Conhecidos profetas e adivinhos, que circulavam pelas aldeias balcânicas, foram convocados ao local. No dia de São Demétrio, em 26 de outubro de 1185, diante do povo, e sob a sugestão dos Asen, eles anunciaram que, em suas visões, a vinda de São Demétrio para Tarnovo significava que o santo havia retirado seus favores sobre os bizantinos e abençoado os búlgaros, e que os auxiliaria na revolta contra seus suseranos. Não poderia ter funcionado melhor: todos os presentes se ofereceram para lutar com os Asen.

Por toda a Bulgária, grupos rebeldes passaram a atacar possessões imperiais, capturando gado e fazendo prisioneiros. A importante cidade de Preslav foi sitiada sob o comando de Teodoro Asen. A cidade não foi tomada, mas os búlgaros retornaram com bois, ovelhas, tudo que puderam saquear no seu entorno. Teodoro teria então investido a si mesmo como Tsar ("César", ou Imperador), e adotado o nome de Pedro II, provavelmente em homenagem a um certo Pedro Delyan, um rebelde búlgaro do século XI (Pedro I, imperador búlgaro, era um aliado dos bizantinos, por isso pouco provável de que tenha sido ele o homenageado).

Isaque estava ocupado demais com os normandos na Trácia para dar a devida resposta a uma revolta camponesa, mas em 1186, o cronista bizantino Nicolau Coniates conta que as forças de Isaque alcançaram os rebeldes em "lugares inacessíveis", mas que uma grande escuridão que subitamente tomou as montanhas (o eclipse solar da manhã de 21 de abril daquele ano) permitiu a sua vitória. No entanto, as fortalezas rebeldes eram construídas nas partes mais escarpadas das montanhas, onde os bizantinos não conseguiam alcançar, e os antigos castelos ao longo do Danúbio, deixados de lado (porque Isaque achava que sua vitória havia sido decisiva), serviam de refúgio aos búlgaros. Depois daquela derrota, enquanto Pedro ganhava tempo negociando uma rendição, Ivan Asen cruzou o baixo Danúbio, para onde regressou com um exército de cumanos (tribo turca que habitava o noroeste do Mar Negro).

Com o auxílio dos cumanos, Pedro liderou a campanha que culminou com a tomada da Moésia - antiga região que corresponde ao centro-norte da atual Bulgária. Enquanto isso, Ivan paralisava as contra-ofensivas bizantinas com a tática de ataques rápidos e retiradas. Em certa ocasião, Isaque II, temendo que seu tio João Doukas (o mesmo que mandou esbofetear Ivan) usurpasse o trono, retirou dele o comando das tropas na Moésia, dando comando a um certo João Cantacuzeno, que era cego e não tinha relações com a família imperial (o exército de Cantacuzeno foi esmagado em seu próprio acampamento em algum lugar nas montanhas). De acordo com uma carta de Nicolau Coniates ao imperador, os irmãos não se contentariam em controlar a Moésia, mas uni-la à "Bulgária" (região que na época correspondia a boa parte da Sérvia, Macedônia, e oeste da Bulgária propriamente dita), "em um império, como nos velhos tempos". Em algum momento de 1187, Ivan Asen teria sido aclamado extra-oficialmente co-Tsar junto a seu irmão.

Finalmente, depois de um cerco mal sucedido à cidade búlgara de Lovech em 1187, Isaque propôs um armistício, reconhecendo Pedro e Asen (Ivan é mais conhecido na posteridade pelo sobrenome) igualmente tsares da Bulgária e a sua independência. A paz entre os dois impérios não duraria muito. Frederico Barbarossa, sacro-imperador romano, conduzia um exército de 40 mil homens para a Terceira Cruzada em 1189, mas pretendia forçar a passagem pelo Império Bizantino (os bizantinos haviam proibido os cruzados a passarem por seu território devido a episódios de saques nas cruzadas anteriores, motivo que levava os cruzados a operações de transporte marítimo pelo Mediterrâneo extremamente complexas). Os Asen ofereceram um exército ao imperador alemão. Como Isaque e Barbarossa acabariam resolvendo a questão diplomaticamente, o imperador bizantino empreendeu campanha contra a Bulgária, mas foi derrotado numa passagem estreita entre as montanhas perto de Triavna por Ivan Asen. Isaque fugiu, deixando tesouros como seu elmo dourado, a coroa e a cruz imperiais, e um relicário de ouro maciço contendo um pedaço da cruz de Cristo para serem capturados (um clérigo búlgaro a jogou num rio, mas foi resgatada). Diz-se que a partir daquele momento Pedro teria coroado oficialmente seu irmão e deixado grande parte da administração imperial com ele, mantendo-se no cargo ao seu lado como conselheiro. Juntos, comandaram campanhas bem sucedidas contra os bizantinos.

Asen acabaria assassinado em 1196 por um nobre valáquio, Ivanko, que estaria tendo um caso com a sua cunhada (ou talvez sob influência de Isaque Angelos, na época deposto, cego e preso, mas que teria oferecido a ele uma filha sua em casamento, como de fato aconteceu). Ivanko, vendo que não teria apoio para destronar Pedro, fugiu para Constantinopla. Pedro nomeou então seu irmão mais novo, Caloian, co-Tsar. Contudo, o tempo inteiro, tanto Pedro como Ivan dependiam das espadas cumanas ao seu lado para fazer valer a sua lei, e teria sido o descontentamento com essa influência estrangeira que moveu um camponês anônimo a assassiná-lo meses depois. E Caloian morreu em 1207 enquanto cercava Tessalônica - dizem os cronistas, morto em sua tenda pela lança do próprio São Demétrio.

O assim chamado Segundo Império Búlgaro chegou a abocanhar a Valáquia, a Albânia e a maior parte da Grécia, e existiu até ser solapado pelos otomanos em 1396.

Neste dia também: Brasil na Primeira Guerra Mundial

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Batalha de Zama

Em 19 de outubro de 202 a.C. foi travada a Batalha de Zama. Foi o confronto final entre Roma e Cartago na Segunda Guerra Púnica, e o evento que determinou o domínio romano do Mar Mediterrâneo pelos séculos seguintes.

Entre 218 e 201 a.C., a emergente República Romana, que compreendia o centro e o sul da Itália e ilhas adjacentes, foi desafiada pelo império capitaneado pela antiga colônia fenícia de Cartago. Tratava-se da segunda guerra em larga escala entre os dois países pelo controle do comércio no Mediterrâneo. A primeira ocorreu quando Roma interviu nos conflitos entre gregos e cartagineses pelo controle da Sicília, resultando na aquisição desta ilha pela República.

A Segunda Guerra Púnica (assim lembrada pelos romanos, pois chamavam aos cartagineses "Poeni", corruptela do grego "phoenike", ou "púrpura", corante que era a principal mercadoria oferecida pelos fenícios, fundadores de Cartago) foi deflagrada após a invasão e conquista da cidade ibérica de Saguntum (atual Sagunto, na Espanha), com quem os romanos mantinham relações diplomáticas. O comandante da operação era Aníbal Barca, designado comandante supremo da Ibéria cartaginesa e filho de Amílcar Barca, o conquistador cartaginês daquele país. O cerco e a conquista desta cidade era o primeiro passo de um plano meticuloso e ambicioso de Aníbal para assegurar o controle sobre o Mediterrâneo, e o passo seguinte seria a invasão inesperada, por terra, da Itália. De maneira espetacular, Aníbal conduziu um exército africano, com elefantes de guerra, pelos Alpes, e obteve vitórias incríveis sobre Roma em seu próprio solo. No entanto, a campanha da Itália nunca chegou a um momento decisivo, e embora Aníbal resistisse no interior da península por mais de 10 anos, esta operação acabou num impasse.

Roma, que havia adaptado a engenharia fenícia na construção da sua própria armada de guerra, conseguiu efetivamente evitar que os fenícios enviassem reforços por mar à Itália, limitando as ações de Aníbal. Com o general invasor imobilizado, os romanos partiram para o contra-ataque na cabeça de ponte cartaginesa na Europa, a Espanha. Os irmãos Gneu e Públio Cipião comandaram uma campanha que começou em Massalia (antigo porto grego sob controle cartaginês, atual Marselha), e prosseguiu, por terra e mar, através dos Pirineus, até o Rio Ebro, onde venceram uma batalha naval que paralisou o esforço cartaginês na Espanha (e o possível envio de tropas a Aníbal ou aos celtas do norte da Itália), embora seu progresso também tenha ficado por aí. Em 211 a.C., os dois Cipiões reuniram reforços entre os celtiberos nativos e marcharam separadamente e quase simultaneamente contra os cartagineses no norte da Espanha, perto de Bétis, onde ambos foram aniquilados. O filho de Gneu, Públio (o mais famoso Cipião, por isso lembrado apenas pelo sobrenome), foi o único a se candidatar ao comando do exército naquela região.

Em 211 a.C. Cipião começou tomando a cidade de Carthago Nova (atual Cartagena). Com romanos e celtiberos sob seu comando, Cipião organizava suas tropas de maneira dinâmica para responder às inconstantes formações dos cartagineses (os comandantes locais, Asdrúbal Barca, Mago, e Asdrúbal Grisco não conseguiam coordenar esforços, e a resposta ao avanço de Cipião era confusa), e aos desafios do terreno acidentado da Ibéria. Em Illipa (próximo a Sevilha), Cipião se defrontou com Asdrúbal Barca, irmão de Aníbal. Recuando o centro do seu exército e avançando com as alas, Cipião envolveu os cartagineses e obteve a vitória final naquele cenário de guerra. Este resultado rendeu a Cipião o consulado em 205 e o controle de seus aliados pessoais da Sicília.

Cipião não tinha o apoio do senado para prosseguir com a guerra. Seu plano era a invasão da África e a submissão de Cartago. Os senadores resistiram ressaltando o perigo, mas a moção acabou aprovada. Contudo, ele partira para a Sicília somente com um corpo de voluntários, e apenas mais tarde ele seria autorizado a recrutar as legiões estacionadas na ilha - na maioria, sobreviventes exilados pela derrota "humilhante" na Batalha de Canas contra Aníbal dez anos antes. Em 203 desembarcou em Utica, na Tunísia, onde esmagou completamente a resistência cartaginesa sob Asdrúbal Grisco. Na ocasião recebeu reforços da cavalaria numídia sob o príncipe africano Masinissa, a quem Cipião conhecera na Espanha e aspirava, com apoio romano, depor o rei Sifax, aliado dos cartagineses (Masanissa ainda perseguiu a cavalaria comandada por Sifax até a capital numida, Cirta, na Argélia, onde foi capturado).

A perda de Utica e a presença hostil de romanos e numídios no coração do seu império levou os cartagineses a solicitarem um tratado. Cipião propôs termos relativamente "suaves"- Cartago abriria mão das suas possessões fora da África, a maioria delas já perdida, e teria que limitar a sua marinha de guerra. Masinissa também teria direito a ampliar seu território sobre as posses cartaginesas no interior da Argélia. O senado cartaginês ainda deliberava sobre os termos, quando Aníbal foi convocado de volta. Aníbal Barca continuava no sul da Itália com o apoio relativo de tribos locais, no comando de um exército muito experiente e leal. No outono de 203 embarcou com seus homens no porto de Crotona.

Com Aníbal de volta, Cartago se sentiu segura para abordar uma frota romana destinada a Cipião que havia encalhado no Golfo de Túnis, e confiscar sua mercadoria. Os romanos viram o ato como uma quebra do tratado, e Cipião marchou para Cartago. Aníbal saiu de encontro a ele na planície de Zama, perto da atual cidade de Siliana.

Os dois exércitos se equivaliam, com ligeira vantagem numérica para Aníbal. Além de infantaria e cavalaria (numídios que serviram com ele na campanha italiana), Aníbal ainda dispunha de 80 elefantes de guerra. Os romanos contavam com três corpos de cavalaria, dois deles de numídios comandados por Masinissa, e outro de romanos sob o comando do general Lélio.

Os dois generais também se equivaliam em perspicácia. Aníbal havia se inteirado das táticas de Cipião na Espanha, especialmente sua estratégia em Illipa de atrair o centro enquanto envolvia as alas do inimigo, e assim dispôs o exército em três fileiras, com a retaguarda mais recuada para dificultar o ataque pelos flancos. Já Cipião previu que Aníbal usaria elefantes, e sabia que os elefantes podiam ser direcionados para uma carga em linha reta, mas que não podiam ser manobrados. Assim, ele separou suas três linhas em blocos, que, ao avançar das feras, se separavam, abrindo corredores por onde os elefantes passavam sem causar prejuízo (para depois serem abatidos).

Com os elefantes fora do caminho, Cipião avançou com a cavalaria. Ele também sabia que Aníbal dependia da força e agilidade da cavalaria numídia (cujos cavalos eram menores do que os cavalos atuais) e se preocupou em levar um número maior dessas unidades para o campo. Como consequência da superioridade numérica romana, a cavalaria cartaginesa fugiu perseguida por Masinissa e Lélio para longe do campo de batalha.

As infantarias então se bateram violentamente, com ligeira vantagem para os romanos. Aníbal mantinha sua terceira fileira recuada, e à medida em que as fileiras em combate eram quebradas, ele as reorganizava integrando-as às alas da fileira anterior, mantendo a força das suas linhas e reforçando seus flancos. No momento em que Aníbal integrou a primeira e segunda linhas, a primeira linha romana (os hastati, ou lanceiros) foi aniquilada. Cipião então reproduziu a estratégia em suas próprias linhas e contra-atacou. A batalha no corpo a corpo seguiu ferrenha.

Num certo momento houve uma pausa, onde os dois generais reorganizaram suas tropas. Ambos formaram uma fileira única, mas Cipião colocou a sua retaguarda nas alas, os lanceiros no meio, e a segunda fila (os principes, aristocratas que possuíam equipamento de melhor qualidade) preenchendo os espaços entre eles. O combate foi violento, mas nenhum dos lados parecia obter vantagem.

Foi quando surgiram as cavalarias romana e numídia cavalgando pela retaguarda cartaginesa (Masinissa e Lélio haviam desbaratado a cavalaria inimiga). A batalha estava perdida para Aníbal, que conseguiu fugir. Mas metade dos seus homens tombou, e outra metade foi presa.

Cartago, sem forças, teve que se submeter a um novo tratado, muito mais duro. Ela teria que pagar um pesado tributo anual a Roma (que arruinaria a sua economia rapidamente) e limitar seu poderio militar a meros 10 navios de guerra. Também não poderia declarar guerra, envolver-se em atos hostis, ou sequer recrutar um exército sem a autorização de Roma. Da parte de Roma, muitos não se deram por satisfeitos: alguns defendiam que o fim da guerra desmobilizaria a população na Itália, fazendo-a retornar a um estado de indolência anterior; outros alertavam para o perigo de se manter um inimigo tão feroz em suas próprias terras e exigiam a destruição total de Cartago. O senador Catão, o Velho, sempre encerrava seus discursos com a frase "Carthago delenda est" ("Cartago deve ser destruída"), mesmo que fosse sobre qualquer assunto não relacionado. De fato, Cartago viria a ser destruída meio século depois quando, ao arregimentar um exército contra a vontade romana para se defender das contínuas incursões do velho Masinissa, provocou nova campanha militar de Roma, resultando na destruição da cidade, extermínio de grande parte da população, e sua terra salgada.

Depois de Zama, Cipião e Aníbal quase se encontraram em outra guerra. Aníbal, em exílio voluntário, colocou-se a serviço do rei Antíoco III na Síria, e temores de que ele preparava outra invasão à Itália (de fato ele recomendara especificamente isto a Antíoco, que preparava uma campanha contra os romanos na Grécia) levaram os romanos à guerra na Ásia. Na derrota, Antíoco deveria entregar Aníbal a Cipião, mas ele fugira a Bitínia, onde servira o rei local (numa das batalhas navais que comandara, bombardeara os navios inimigos com vasos cheios de cobras venenosas). O rei da Bitínia foi, também persuadido pelos romanos a entregar Aníbal, mas ele continuou a fugir. Antes de morrer, em algum ponto da costa oeste da Turquia entre 185 e 183 a.C, ele teria deixado uma carta que chegou a Roma, dizendo "Vamos aliviar os romanos da ansiedade que têm experimentado por tanto tempo, já que eles acham um teste de paciência muito grande esperar a morte de um velho".

E Cipião (cujo sucesso na Segunda Guerra Púnica lhe rendeu o apelido de "Africano") seria acusado por seus adversários, incluindo Catão, de aceitar suborno de Antíoco (ele havia defendido publicamente o irmão de tê-lo aceito, e, por causa disso, foi acusado também). Salvo pelos amigos de ser levado a julgamento, ele se retirou da vida pública em sua propriedade, próximo a Nápoles, onde morreu (à mesma época de Aníbal) e foi sepultado. Otaviano, o primeiro imperador romano, século e meio depois, visitou o local para prestar-lhe homenagens. Sua amargura pelo tratamento que recebera em Roma após os anos de serviço (pela primeira vez Roma conquistava territórios fora da Itália e das ilhas próximas) teriam-no feito ordenar a inscrição em seu túmulo: "Ingrata patria, ne ossa quidem habebis" ("Pátria ingrata, não terá sequer os meus ossos").

No filme O Gladiador, o personagem de Russell Crowe, Maximus, é escalado para um espetáculo no Coliseu onde se recriaria a Batalha de Zama. Maximus e seus colegas, representando as forças de Aníbal, rebelam-se vencendo a batalha e arruinando o espetáculo.

Neste dia também: Independência ou Morte no Piauí

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Favorita das Nove Musas*

Em 18 de outubro de 1773, Phillis Wheatley, poetisa e escrava, recebeu a alforria.

Phillis Wheatley nasceu na África ocidental (talvez no Senegal, mas a origem é incerta), e foi vendida por um chefe tribal aos 7 anos a um comerciante de escravos. A menina, ainda sem nome, foi trazida num navio negreiro chamado Phillis ao mercado de escravos no porto de Boston em 1761. Ali, a sorte que havia lhe faltado sorriu: ela foi adquirida pelo alfaiate John Wheatley, para servir de companhia e ajudante à sua esposa Susannah. Wheatley era reconhecidamente um progressista notável que, embora mantivesse escravos domésticos a seu serviço, os tratava e mantinha com dignidade. A menina, batizada Phillis (em lembrança ao navio que a trouxe à América), e Wheatley (como de costume, para assinalar a propriedade da família que a comprou), ficou sob a tutoria da filha mais velha do casal, Mary, que a alfabetizou.

Mary, contudo, percebeu a facilidade de aprendizado e uma habilidade notável no uso e na expressão de línguas, não apenas do inglês - aos 12 anos, Phillis lia grego e latim, e interpretava passagens da Bíblia. Estava familiarizada com os poemas de Pope, Milton, Virgílio, Homero. Phillis começou a escrever aos 14 anos. Seu primeiro poema, "To the University of Cambridge, in New England" começa assim (e eu traduzo livremente):

"Enquanto um intrínseco ardor induz a escrever,
As musas prometem assistir a minha caneta;
Não faz muito tempo desde que deixei minha costa nativa
A terra de erros, e melancolia egípcia:
Pai de misericórdia, foi tua mão graciosa
Que me trouxe em segurança daquelas escuras moradias."

Impressionados pelo talento de Phillis, os Wheatley dispensaram-na dos serviços domésticos e investiram integralmente em sua educação. Quando completou 20 anos, Phillis foi enviada a Londres sob recomendação médica. Susannah Wheatley incentivou a viagem porque acreditava que Phillis teria mais facilidade para publicar seus poemas lá do que em Boston. De fato, em 1772, antes de partir para Londres, uma comissão de cidadãos de Boston abriu processo contra Phillis, questionando que uma escrava africana pudesse escrever poesia de qualidade, e precisou que ela se submetesse a uma corte, na presença de intelectuais locais (entre eles, John Hancock, um dos signatários da Declaração de Independência), para atestar a autoria dos seus poemas. Em 1773, em Londres, publicou seu livro "Poemas Sobre Vários Assuntos, Religiosos e Morais" (o documento produzido pelos intelectuais de Boston no ato do julgamento foi incluído no prefácio da primeira edição), e caiu nas graças da nobreza britânica. Já editores na América se recusaram a publicá-lo. Foi logo após a publicação em Londres e seu retorno que John Wheatley (talvez por pressão dos influentes amigos de Phillis) concedeu-lhe a alforria:

"Desde meu retorno à América meu Mestre, segundo o desejo de meus amigos na Inglaterra, deu-me a liberdade".

A vida de Phillis Wheatley depois da escravidão, contudo, não foi fácil. Seus antigos mestres e protetores faleceram, Susannah em 1774 e John em 1778. A poetisa não gozava de boa saúde, o que atrapalhava seu trabalho. Em 1778 casou-se com John Peters, um negro livre que tinha uma quitanda, e com ele viveu anos de pobreza, perdendo dois bebês. Ela tentou publicar um segundo volume de poesias, mas já na época da Revolução Americana havia pouco interesse e recursos para isso. Peters foi preso por dívidas em 1784, e poucos meses depois, ela morreu enquanto trabalhava como assistente de cozinha de uma estalagem. Seu terceiro filho morreu na mesma época, e os dois foram enterrados juntos numa cova comum.

Phillis Wheatley tornou-se a primeira escrava negra na América a publicar uma obra literária. Em Londres, onde o estigma da escravidão não lhe tomava a liberdade de expressão, relatava experiências e opiniões diversas nos círculos de intelectuais que frequentava. Porém o corpo da sua poesia, finamente ritmado e essencialmente devocional, religioso, raramente toca nas suas experiências pessoais. De fato, ela expressava, por exemplo, sentimentos ambíguos quanto à escravidão, devido à benfeitoria dos Wheatley em sua vida, o que levou autores negros contemporâneos, e estudiosos posteriores a criticar a postura (o uso progressivo de símbolos classicistas nos seus poemas, uma provável adaptação ao que ainda guardava da sua cultura ancestral, levou o escritor e escravo Jupiter Hammon a criticar seu "paganismo", dedicando a ela um poema composto por versículos bíblicos). No poema "Sobre Ter Sido Trazida da África para a América", ela louva a sua condição de escrava por ter permitido que conhecesse o Cristianismo, mas firma o pé na contestação do senso comum da época de que negros tinham uma linhagem e um destino espiritual distintos dos brancos:

"Foi misericórdia que me trouxe de minha terra Pagã,
Ensinou minha alma ignorante a entender
Que há um Deus, que há um Salvador também:
Uma vez que a redenção não procurei nem conhecia.
Alguns veem nossa negra raça com olhos desdenhosos,
'Sua cor é uma tintura diabólica.'
Lembrem-se, Cristãos, Negros, pretos como Caim
Podem ser refinados e juntar-se ao seu cortejo de anjos."

Em 1775, já durante a Revolução, época em que os poemas de Phillis Wheatley tomavam ares heroicos frequentando temas patrióticos e elogiando figuras públicas, ela escreveu uma carta ao recém nomeado comandante-em-chefe do Exército Continental, George Washington. O poema terminava nos versos:

"Continua, grande chefe, com virtude ao teu lado,
Todas as tuas ações deixa que a deusa guie.
Uma coroa, uma mansão, e um trono que brilhe,
Com ouro inalterável, WASHINGTON! Sejam teus."

Washington respondeu a carta, endereçando-se a "Senhorita Phillis", desculpando-se pela demora (5 meses entre o envio da carta de Phillis e a resposta de Washington), elogiando as "linhas elegantes" e seu "marcante talento poético". Ele diz ainda que teria arranjado sua publicação, se isso não parecesse um ato de vaidade e auto-promoção da sua parte (mas compartilhou-o com o tenente-coronel Joseph Reed, que teria encaminhado-o para o jornal The Pennsylvania Magazine em 1776), convidando-a a encontrá-lo em Cambridge. Por fim, dedica a carta à ex-escrava como "seu obediente e humilde servo".

Em Boston foi erigido em 2003 um monumento homenageando três mulheres importantes da história americana: Abigail Adams, esposa e conselheira do "Founding Father" John Adams e mãe do presidente John Quincy Adams; Lucy Stone, abolicionista, feminista e sufragista; e Phillis Wheatley.

*O almirante escocês-americano John Paul Jones pediu que um subordinado enviasse seus próprios escritos a "Phillis a Africana, favorita das Nove e Apolo".

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Agripina, A Velha

Em 17 de outubro de 33 d.C. faleceu de desnutrição a romana Agripina ("A Velha", porque tinha uma filha homônima, conhecida como "A Jovem"), adversária do imperador Tibério e mãe do seu sucessor, Calígula.

Na sociedade romana, à época da dinastia Júlio-Claudiana, os homens eram os executores da vida pública, ocupantes exclusivos dos cargos de cônsul, senador, pretor, general, pontífice. Eram maridos, cabeças de suas famílias, provedores do lar. Das mulheres era esperado o recato, a modéstia, a obediência, e um útero fértil. Quaisquer mulheres que não se enquadrassem nesse modelo, independente da sua sagacidade, capacidade produtiva, caráter, eram mal vistas pelos romanos. Porém, como toda boa sociedade fortemente patriarcal, a vida política romana sempre teve, nos seus bastidores, a influência das esposas e amantes dos seus figurões mais ilustres. Agripina, quem o historiador Tácito, sob o ponto de vista do homem romano, a descreve como alguém "intolerante na rivalidade, sedenta de poder, (ela) tinha as preocupações de um homem", era uma mulher cuja virtude extrapolava o que se esperava de uma romana, enquadrando-se tanto no espectro da matrona virtuosa e recatada, quanto da leoa que se imiscuía nos negócios públicos em busca de justiça.

Vipsania Agripina, nascida em 14 a.C., era filha de Marcus Vipsanio Agripa, amigo de longa data do imperador Otaviano, e da única filha biológica deste, Júlia. Entre os patrícios romanos os casamentos eram arranjados e desfeitos para fortalecer alianças ou aproximar inimigos, e havia muito pouco que os noivos pudessem fazer. Depois de anos de casamento feliz com Agripa, quando este morreu Júlia foi oferecida em casamento ao herdeiro legal de Otaviano, Tibério, um homem soberbo e emocionalmente instável, com quem viveu miseravelmente; não foi surpresa, embora tenha sido um escândalo, quando Otaviano puniu Júlia com o exílio por adultério. Como resultado, a jovem Agripina, então adolescente, ficou sob a guarda da atual esposa de Otaviano, Lívia.

Lívia era uma verdadeira arquiteta política. Seu marido (a quem arrebatara quando era casado e ainda compartilhava o poder com os rivais Marco Antonio e Marco Lépido) era o imperador; embora Otaviano adotasse legalmente alguns jovens promissores, ela arranjara para que Tibério, seu filho de um casamento anterior, se tornasse seu herdeiro, enquanto seus possíveis rivais caíam um a um, provavelmente envenenados sob suas ordens (bem como o próprio Otaviano, que gozava de boa saúde na velhice); com Tibério pavoneando-se no poder, trabalhava como uma das principais articuladoras políticas do seu reinado.

Já Otaviano era um homem astuto, que conhecia as artimanhas e a capacidade de realização de Lívia e procurava direcioná-las para benefício comum. No entanto, seu ímpeto frequentemente entrava em conflito com os planos da esposa. Quando Júlia foi exilada e Agripina trazida para o seu convívio, Otaviano se afeiçoou a ela e a protegeu, oferecendo-a em casamento a Germânico, um jovem e charmoso neto de Marco Antonio e parente de Lívia, da influente família dos Cláudios. Germânico, além de bem apessoado e gentil, era um militar capaz. Suas vitórias na Germânia e na Gália (notadamente, o resgate da última das três Águias Perdidas) o tornavam imensamente popular. A modéstia e a frugalidade de Agripina, sua devoção por Germânico (com quem viveu um casamento verdadeiramente feliz, se confiarmos nas fontes contemporâneas, acompanhando-o em campanha e mesmo atuando como diplomata) a tornaram uma favorita do povo. O casal deu à luz nove filhos, com seis deles chegando à idade adulta.

Otaviano já havia designado Tibério seu sucessor, mas exigiu que o enteado fizesse o mesmo com Germânico. Quando Otaviano morreu, as coisas mudaram. Tibério, que não gozava das virtudes nem da popularidade de Germânico, o via como uma ameaça. Germânico foi então enviado para o oriente (para longe de Roma), para comandar a Síria. Em seu auxílio foi designado o general Calpúrnio Piso, com quem Tibério mantinha estreitas relações, supostamente para mantê-lo sob controle. Piso e Germânico se desentenderam publicamente em pelo menos uma ocasião (após retornar do Egito, Germânico teria constatado que Piso ignorara instruções suas acerca das tropas na Síria). Ali, Lívia talvez tenha sido solicitada para ajudar Piso a resolver a questão, porque, logo em seguida, Germânico passara mal, acusando o colega de tê-lo envenenado. Germânico morreu no ano 19, deixando Piso no comando da província.

Agripina retornou a Roma com as cinzas do seu marido. Ao receber a notícia do falecimento de Germânicos, o povo romano entrou em luto antes mesmo do senado o declarar oficialmente, e diante da urna com suas cinzas, discursos e homenagens eram prestadas por figuras públicas, incluindo o próprio Tibério. Mas Agripina não se contentaria com demonstrações públicas de afeto. Ela compartilhava da convicção de Germânico de que teria sido envenenado, e que o responsável era Piso (isso não está expresso nas fontes, mas sua mente não deve ter ido muito longe para ligar a atuação de Piso a Tibério). De fato foi aberto processo e Piso foi indiciado, não por assassinato, mas por traição e desacato. Ele se suicidou antes da condenação.

A queda de Piso não satisfez o senso de justiça de Agripina. Ela exigia de Tibério que ele nomeasse um dos seus filhos seu herdeiro, em substituição a Germânico (Tibério tinha um filho Tibério Gemelo, que despontava como seu favorito). Lívia e a sogra, Antonia, mantinham os filhos de Agripina o mais longe possível da mãe. Ela se tornava cada vez mais solitária, e sua relação com Tibério cada vez mais amarga, chegando ao ponto de enfrentá-lo em particular algumas vezes, acusando-o de perseguir, através dela e de seus filhos, o sangue de Otaviano.

Senadores, preocupados com a crescente influência do prefeito pretoriano Sejano (a quem Tibério delegava muitas das suas atribuições quando, em crises emocionais, exilava-se em inacreditáveis orgias na ilha de Capri), buscaram apoio na boa reputação de Agripina, que abraçou a causa. Tibério passou a desconfiar dela, e, num jantar privado, ofereceu-lhe uma maçã para testá-la. Agripina recusou-se a comer, acreditando estar envenenada. Pouco depois ela foi presa com dois de seus filhos, acusada de conspiração (Tibério temia que ela buscasse apoio das legiões leais a Germânico, usando a reputação do marido e o parentesco do avô Otaviano a seu favor).

Agripina e os filhos acabaram banidos para a ilha de Pandataria (atualmente Ventotene), o mesmo local para onde sua mãe Júlia havia sido exilada. Seus protestos constantes eram punidos com castigos físicos (algo raramente aplicado em condenações deste tipo), e ela acabou cega de um olho. Depois de quatro anos do exílio, morreu de inanição (segundo Tácito por greve de fome, mas talvez por ter sido deliberadamente privada de comida, não se sabe), mesmo destino de seu filho Druso, enquanto o outro filho, Nero, se suicidou aguardando julgamento. Ironicamente, Sejano encontrou seu fim antes de Agripina, quando Tibério mandou executá-lo por conspiração. Quando soube da morte de Agripina, Tibério declarou o dia do seu nascimento uma data de mau agouro.

O último filho homem vivo de Agripina, Caligula, criado sob a vigilância de Lívia, sucedeu Tibério como imperador no ano 37. Ele revertera a condenação de Tibério e suas ordens para que o nome de sua mãe fosse riscado da história, e depositou suas cinzas no Mausoléu de Augusto, declarando um dia anual para que os romanos lhe prestassem homenagens. Calígula acabaria assassinado e sucedido pelo primo de sua mãe, Cláudio, e este, por sua vez, substituído pelo seu neto Nero.

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Duas Chinas

Em 11 de outubro de 1142 foi ratificado o tratado de Shaoxing entre a Dinastia Jin, que controlava o norte da China, e a Dinastia Song, que dominava o sul, formalizando o fim da guerra entre os dois Impérios.

Embora se sustente que a China seja o país que existe continuamente há mais tempo no mundo atual (desde a unificação dos seus reinos em 221 a.C.), a sua história é bem mais complicada do que uma uma sucessão linear de governantes no atual território chinês. Por vezes, o que chamamos de "China" chegou a ter mais de um imperador simultaneamente. Era o caso das dinastias contemporâneas Song e Jin.

A Dinastia Song emergiu do caos que se seguiu à dissolução da dinastia Tang em 907. Os Tang vinham perdendo controle sobre os senhores da guerra e administradores provinciais do seu território, que, cada um à sua maneira, tornaram suas terras virtualmente independentes debaixo do nariz dos seus últimos imperadores. Depois de 907, pelo menos 10 reinos diferentes existiram na China, enquanto famílias nobres lutavam inutilmente entre si pelo cargo simbólico de Imperador (o período entre 907 e 960 é conhecido como Cinco Dinastias e Dez Reinos). Foi um período de disputas violentas entre os vários poderes emergentes em busca de estabilidade e supremacia, até que em 960, Zhao Kuangyin, um jovem militar que tivera ascensão meteórica no reino de Hou Zhou, depôs o neto do seu antigo suserano e assumiu para si o título de Imperador. Aconteceu de Zhao Kuangyin estar à frente de um exército em marcha quando espalhou-se o rumor entre os soldados de que um vidente teria visto um sinal indicando que o Mandato dos Céus (o ato divino conferido aos "justos" que legitimava o poder imperial) deveria ser entregue a ele. O rei era um menino de 7 anos, e não foi muito difícil para que Zhao fosse entronizado pelos seus comandados depois disso. Ficaria conhecido como Imperador Taizu, fundador da Dinastia Song.

Nos 17 anos de reinado de Taizu, o Império Song, firmemente centrado na cidade de Kaifeng, no noroeste da China, conquistou primeiro os reinos do sul, para depois investir nos reinos ao norte. O sucesso dos Song se deveu principalmente à reforma administrativa de Taizu (instituindo nomeações por concurso público ou exame de mérito, ao invés do loteamento de cargos entre aristocratas e militares), e no investimento em cartografia - o conhecimento detalhado dos domínios Song levou à confecção de um atlas, favorecendo a aplicação eficiente de políticas públicas. Inovações técnicas e científicas também eram favorecidas por incentivos públicos. A diplomacia Song mantinha embaixadas na Índia, Pérsia, Coréia, Egito, Srivijaya (o opulento império comercial que dominava a passagem do Estreito de Malaca), mantendo ainda relações com o Japão e o Império Bizantino.

Ao norte do que os Song consideravam seu, nas vastas planícies entre a Mongólia e a Manchúria, a ausência de um poder central chinês favoreceu a organização e estabelecimento de Estados rivais controlados por antigos povos nômades que emulavam o modelo administrativo chinês. Após a queda dos Tang, a etnia kitai foi unificada num império próprio, designando sua casa reinante como a Dinastia Liao. Liao é tratado pela historiografia chinesa tradicional como um reino estrangeiro, mas seu sucessor, a Dinastia Jin, teria tratamento diferente. Como os kitai, os jurchen, nativos da Manchúria, emergiram como tribos mais ou menos independentes, embora submetidas a Liao. Porém, conforme o poder central afrouxava, os jurchen rebelavam-se, realizando ataques pontuais e saques a cidades. Depois de uma campanha bem sucedida ao lado dos coreanos, os jurchen uniram-se sob um governante comum, e a partir de 1115, forjariam seu próprio império sobre as ruínas de Liao, a Dinastia Jin. Os kitai manteriam sua soberania por mais algum tempo no reino de Qara Kitai, no noroeste da China.

Os Song haviam firmado aliança com os Jin contra Liao, mas nunca forneceram os exércitos prometidos. Logo após o fim da Dinastia Liao - pela captura do seu Imperador Tianzuo em 1125 - a Dinastia Jin rompeu a aliança e partiu para a ofensiva sobre o nordeste do domínio Song. Em dois anos, a capital Song, Kaifeng, cairia sob domínio Jin. Uma conspiração de nobres centrados em Beijing contra os Song foi instrumental para o sucesso dos Jin no norte da China. Os Imperadores Jin, agora controlando partes da China de facto, só poderiam tê-lo feito sob o Mandato dos Céus, o que os legitimaria, portanto, como governantes chineses. Na prática, os jurchen, à medida em que migravam para as novas áreas conquistadas, incorporavam para si características culturais chinesas, e sua nobreza era educada nos clássicos chineses.

Jin e Song passaram mais de uma década numa guerra de atrito, interrompida temporariamente por intrigas palacianas, rebeliões internas, e questões de sucessão. Para os Song a situação ainda era mais crítica, pois a crise levava oficiais chineses (tanto leais aos Song, como os que estiveram a serviço de Liao) a preferirem oferecer seus serviços aos conquistadores estrangeiros do que ao seu próprio imperador.

A corte Song (ou o que restava dela após a captura de Kaifeng) havia cruzado o rio Yantse e reagrupado na atual cidade de Hangzhou, virtualmente abandonando todas as terras ao norte do rio Huai para os Jin. Porém, há evidência de que o novo Imperador Song eleito, Gaozong (um usurpador, mas o usurpador que a nobreza Song precisava), preferia evitar o conflito com os Jin para impedir a restauração do imperador deposto em Kaifeng, Qinzong. Manobras políticas conduziram a acusação de importantes militares Song por traição, responsabilizando-os pelas derrotas dos Song. Um deles, Yue Fei, estava prestes a retomar Kaifeng quando foi chamado a Hangzhou, onde foi preso e executado. A política de conciliação dos Song do sul com o Jin conduziu ao Tratado de Shaoxing, em que os Song abdicavam de todas as terras ao norte do Huai e se comprometiam a pagar tributo anual aos rivais do norte. Os Song sobreviveram no sul graças ao investimento na construção de uma marinha mercante e uma marinha de guerra, já que manteve controle sobre algumas das principais cidades portuárias da China.

Já os Jin precisaram desviar energia para conter revoltas dos remanescentes kitai em seus domínios, bem como de clãs jurchen que se opunham à sinificação, e conflitos com o reino tangute de Xi Xia no leste. A guerra com os Song foi suspensa não apenas por força de tratado (rompido em algumas ocasiões, porém em batalhas inconclusivas), mas pela incapacidade dos Jin de direcionar recursos para esta frente. Mas a queda começou quando as tribos mongóis começaram a se movimentar pela unificação em torno de Genghis Khan. Genghis arrasou Xi Xia entre 1205 e 1209, e em 1211 invadiu o império Jin com 50 mil guerreiros montados, dez vezes menos do que o estimado para o exército Jin - e mesmo assim, em 1214, os Jin assinaram um tratado desfavorável com os mongóis. O filho de Genghis, Ogedei, comandando um exército engordado por chineses insatisfeitos, esmagou tanto Xi Xia quanto Jin entre 1232 e 1234.

Já os Song resistiram até 1279. Foi durante a campanha de expansão para o sul que Kublai Khan, que acumulava para si o cargo de Grande Khan do imenso Império Mongol e de administrador da China, instaurou a si mesmo Imperador chinês, fundando a dinastia Yuan em 1271. Uma batalha naval em Yamen (com enorme superioridade numérica Song, e um exército invasor composto praticamente todo por soldados e marinheiros chineses) resultou na morte do último imperador Song e sua corte, ou por suicídio, ou por afogamento.

Ironicamente, a China como existia precisou ser destruída por outro invasor estrangeiro para ser, enfim, reunificada. Após o estabelecimento da Dinastia Yuan, a China, embora tenha sido invadida e repartida entre administradores estrangeiros e estados-fantoches algumas vezes, nunca mais foi dividida.