sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Paz Porfiriana

Em 16 de outubro de 1909, agentes de segurança americanos desarmaram um suspeito de atentado contra a vida dos presidentes Porfírio Díaz do México e William Taft dos Estados Unidos durante uma reunião na cidade de El Paso, Texas.

Em 1909, o presidente Porfírio Díaz já governava o México havia sete mandatos consecutivos. Sua subida ao poder se deve, principalmente, à sua popularidade adquirida durante os anos de guerras que marcaram o fim da monarquia e a intervenção francesa no México (que apoiava a monarquia). Quando seu antigo conhecido Benito Juárez, já na presidência, foi reeleito em 1870, Díaz, que fora candidato derrotado, liderou uma sublevação mal sucedida em 1871. O reeleito Juárez faleceu e foi sucedido pelo vice, Lerdo de Tejada, que anistiou Díaz, mas logo teve que confrontá-lo em combate durante a Revolta de Tuxtepec - Díaz alegava que a presidência deveria ser ocupada por um presidente eleito. Depois da Batalha de Tecoac, Tejada fugiu do país, e Díaz tomou o seu gabinete, embora o presidente em exercício fosse o presidente da Suprema Corte, agora José Maria Iglesias. Díaz foi em frente para removê-lo também. Com Iglesias fugindo do país, novas eleições foram convocadas, e Porfírio Díaz foi eleito presidente com larga margem em 1877.

Quando assumiu a presidência, Díaz se deparou com um Estado cuja autoridade era extremamente precária fora das maiores cidades, de um país vastamente rural e subdesenvolvido, e arruinado desde a guerra contra os Estados Unidos em 1846, quando perdeu metade do seu território. Díaz subiu na carreira cercado de liberais radicais, mas era extremamente pragmático. Diante de tão grandes problemas, deixou de lado processos democráticos e tomou decisões personalistas para impor a ordem pública que passavam por cima de direitos civis - segundo ele mesmo, a política do "pão ou pau". Com sua rede de apoiadores entre os militares, implementou, com forte e disciplinada presença do exército e uma centralização crescente do controle sobre a polícia, a "Paz Porfiriana", que combateu bandoleiros, mas também esmagou movimentos populares anti-governistas. O reconhecimento oficial dos Estados Unidos, que oferecia asilo a Lerdo de Tejada, veio depois de um pagamento de 300 mil dólares. Díaz também cimentou sua posição na presidência beneficiando abertamente aliados políticos, apaziguando grupos em conflito concedendo-lhes privilégios específicos (dar um pouco a cada um passava uma falsa sensação de democracia), e alterando, ironicamente, a Constituição para permitir a reeleição. Exceto no mandato que o sucedeu em 1880, quando foi eleito presidente seu homem de confiança, Manuel González Flores, veterano que perdera um braço na guerra contra a França, Díaz (que foi ministro de Flores) governou inconteste o México até 1911.

Também fez um grande trabalho de propaganda em torno de sua imagem, e suprimiu as críticas da grande imprensa com a censura ou a troca de favores, de maneira que, depois de um tempo, poucos ainda se lembravam da sua cruzada contra a reeleição de Benito Juárez. A memória que existia era a dos dezesseis anos de caos político e social que se seguiram ao fim da Segunda República, de modo que a Paz Porfiriana representava um enorme progresso.

A posição de Porfírio Díaz era tão soberana que, em certo momento, se tornou, concomitantemente, líder da maçonaria mexicana, e conselheiro dos bispos católicos. Embora assegurasse o poder supremo e, de qualquer forma, atingisse consideravelmente seu objetivo de pacificar o país, a administração personalista de Porfírio Díaz estava na realidade fragilizando as instituições republicanas. Para neutralizar a oposição, escalou amigos próximos para todas as posições de poder, e estruturou os órgãos públicos para que respondessem diretamente a ele. Enfraqueceu o caráter federalista (que definiu o nome oficial do país, Estados Unidos Mexicanos), limitando a autonomia dos estados e suas legislaturas quanto às decisões da presidência. Com a vida pública centralizada nas decisões de um homem agindo conforme seus planos de momento, a população nunca sabia o que esperar. Menos ainda os homens de negócio. A pacificação do interior começou a atrair o interesse de investidores estrangeiros, visando investimentos na mineração, agricultura, em infraestrutura, indústria, e comércio. Para negócios agropecuários, promoveu desapropriações de terras pequenos proprietários e reservas indígenas, redefiniu seus limites, e as vendeu.

Em 1908, já idoso, Porfírio anunciou que se retiraria da política ao final do seu mandato. Talvez tenha se impressionado com a voracidade com que os políticos, então sob perfeito controle, começaram a se agitar para definir seus candidatos. Um deles, Bernardo Reyes, então governador de Nuevo León, foi preventivamente enviado em missão à Europa para que não estivesse no país. Eventualmente Díaz desistiu da aposentadoria e começou a investir em mais uma campanha eleitoral, aceitando a candidatura rival de Francisco Madero (eventualmente ele mandara prender Madero pouco antes do pleito). Sua popularidade, contudo, declinava à medida em que, aos 78 anos, já não tinha o mesmo vigor para conduzir a política do país.

Ao longo dos anos, investidores americanos haviam injetado bilhões na economia mexicana. Em 1909, havia investimentos no valor aproximado de 800 milhões de dólares em valores da época no México, e cerca de 70 mil cidadãos americanos morando no país. Mas a incerteza sobre a sucessão fez com que esses mesmos investidores se virassem ao seu governo para achar uma saída para a crise. Porfírio Díaz então convidou o presidente William Taft para um encontro em ambas as cidades de El Paso, no Texas, e Ciudad Juárez, em Chihuahua. Havia uma pendência entre os dois países com relação à fronteira que passava entre as duas cidades. Uma mudança numa curva do Rio Grande, por onde corria a fronteira original, levou à assimilação de território formalmente mexicano pelos americanos (incorporando-o à cidade de El Paso), gerando grande tensão na região. Mas Taft estava mesmo interessado nos planos de Díaz para a sucessão presidencial e em assegurar os investimentos americanos no país em longo prazo. Para Díaz era uma boa oportunidade de fazer uma aparição e renovar a sua popularidade naquele ponto importante da fronteira. O encontro entre Díaz e Taft seria o primeiro encontro entre presidentes do México e dos Estados Unidos.

Sob o clima tenso da região, Taft chegou escoltado por Patrulheiros do Texas (uma espécie de milícia sob jurisdição do governo texano), agentes do Serviço Secreto, FBI, e o corpo de segurança pessoal do presidente, além de 250 seguranças contratados por um empresário americano diretamente interessado nas discussões da ocasião. Díaz mobilizou 4 mil soldados mexicanos. O encontro aconteceu no dia 16 de outubro. Naquela manhã, Taft chegou a El Paso e tomou um café da manhã no Hotel St. Regis. Díaz chegou às 11:00, paramentado com uniforme militar e o peito coberto por medalhas. Foi apresentado formalmente a Taft, trajando um terno comum. Os dois se reuniram a sós por vinte minutos. Uma hora depois, passaram a Ciudad Juárez, a primeira vez que um presidente americano atravessou a fronteira mexicana, para outra reunião no prédio da câmara do comércio local (que havia sido redecorado de maneira a se parecer com o Palácio de Versailles), onde concederiam uma coletiva de imprensa, posariam para fotos, e em seguida participariam de um extravagante banquete. Ciudad Juárez foi decretada capital federal para o evento. No dia seguinte ambos os mandatários retornaram para seus países.

No mesmo dia 16, em Los Angeles, o jornal Herald reproduziu uma notícia publicada em Chicago de que havia sido descoberto (por uma carta anônima enviada ao jornal) um plano de anarquistas para assassinarem os presidentes Taft e Díaz em El Paso. Os envolvidos estariam se reunindo havia duas semanas para planejar o atentado. Jornais e agências governamentais nos Estados Unidos vinham recebendo cartas anônimas com ameaças, como "uma bomba está pronta para Díaz". É certo que o serviço de inteligência americano estivesse trabalhando com essa informação, e por isso tenha organizado um esquema de segurança tão forte. Mesmo assim, quando os dois presidentes deixavam El Paso, o chefe da segurança contratada e um dos patrulheiros texanos identificaram um homem parado com um pequeno revólver na mão em frente à câmara do comércio local, de onde o cortejo se aproximava. Os dois homens imobilizaram e desarmaram o suspeito a poucos metros dos dois presidentes, antes que pudesse disparar um tiro. Eu, pessoalmente, não consegui alguma fonte que confirmasse a identidade do suspeito, mas o serviço de inteligência americano estava procurando naquele momento por Alexander Berkman, escritor lituano e anarquista radicado em Nova Iorque que já havia cumprido 14 anos na prisão por uma tentativa de assassinato.

A carreira de Porfírio Díaz tomaria um novo rumo. Ele foi de fato reeleito em 1910 pela oitava vez, a sétima consecutiva, mas resistiria no poder por apenas alguns meses. Naquele ano explodiu a Revolução Mexicana. Seu concorrente à presidência Francisco Madero contestou o resultado das eleições e levantou apoiadores contra Díaz. Sua demanda pela devolução das terras dos pequenos agricultores trouxe as classes menos favorecidas para o seu lado. Em 1911 Ciudad Juárez caiu, e logo depois Porfírio Díaz se viu forçado a exilar-se na França, onde morreu em 1915. William Taft esperava sinceramente que o mandato de Díaz durasse mais do que o seu, porque considerava que uma revolução no México exigiria uma ação americana para proteger seus interesses, mas essa que intervenção seria extremamente complicada (Taft deixou a presidência em 1913, sem ter tomado qualquer ação). Voltando-se contra o próprio Madero logo no início, visto como "traidor" e "representante das elites" pelo movimento tornado vigorosamente popular, a guerrilha se prolongou por 10 anos com mais de um milhão de mortos. O interesse da imprensa americana elevou alguns dos seus líderes, como Pancho Villa e Emiliano Zapata à fama internacional.

A questão da fronteira foi resolvida com um tratado ratificado por ambas as partes em 1963.

Nenhum comentário:

Postar um comentário